A LÍNGUA DOS OUVINTES: Tensões no uso da Língua Portuguesa Brasileira por surdos
Estranhamento- Lingua do ouvinte- LIBRAS- Análise Crítica do Discurso
Nosso objeto se enquadra nos estudos discursivos, dadas as emergências de trazer visibilidade à condição linguística do surdo, condição que também é social, com implicações. Neste sentido, percorremos como objetivo geral, que se configura em analisar de acordo com fundamentos da ACD, que tensões aparecem nas representações de surdos sobre a Língua Portuguesa brasileira em seus relatos, postados no site YouTube. Entendemos que essas tensões advêm do estranhamento (Peixoto, 2006; Herrmann, 2017) que a Língua do outro acentua nos surdos. A presente pesquisa parte de um olhar às expectativas dos surdos sobre o Português Brasileiro. Os relatos disponibilizados na plataforma do Youtube têm algo em comum: sua visão sobre a língua, sua experiência de aprendizado, e o olhar para a escrita que, no caso, é a segunda Língua para os surdos. Tem-se como objetivo principal do trabalho verificar em que medida tal público se manifesta em relação a esse aprendizado, no que diz respeito aos conflitos e estranhamentos, de modo a caracterizar as representações produzidas e disseminadas por tais pessoas na plataforma do YouTube. A dissertação foi desenvolvida em diálogo interdisciplinar, ancorado no arcabouço teórico e metodológico da Análise Crítica do Discurso, doravante ACD, tendo como referências as contribuições de Fairclough (2001a, 2003, 2009), especialmente no que diz respeito aos significados acional (gêneros), representacional (discursos) e identificacional (estilos). Destacam-se contribuições como as de Hall (2006), Amossy (2005), Strobel (2009), Herrmann (2017). Na pesquisa a Língua Portuguesa brasileira é intitulada como Língua dos ouvintes, em paralelo com a Língua da comunidade surda brasileira, a Libras. A análise de oito vídeos gravados por surdos proporcionou a observação à materialidade discursiva, resultou na transcrição de vinte e sete relatos sobre a relação direta e indireta com esse segundo sistema linguístico. Percebeu-se um conjunto de estranhamentos que povoam os relatos desses, resultando em tensões e inadaptações ao aprendizado do Português que lhes é imposto como norte na vida social, principalmente para serem aceitos. Tais estranhamentos evocam os conflitos que a Língua dos ouvintes acarreta na vida desses surdas, os quais detalhamos na análise. O corpus revela o conjunto de tensões sinalizadas por essas pessoas, dada a imposição no aprender e utilizar a Língua dos ouvintes nas instituições, seja nos eventos sociais, seja nas variadas situações cotidianas com efetividade. São relatados ainda outros conflitos que cercam o aprendizado da escrita da Língua Portuguesa pelos surdos que relatam suas experiências, esclarecendo que o contato com a escrita dos surdos nem sempre é considerado típico do resultado do contato com uma língua que lhe é sua segunda língua, mas cobrada por vezes pelos ouvintes como a majoritária, “a mais importante”. Os surdos esclarecem que sua escrita difere da escrita do falante nato do Português Brasileiro. Problematizamos, portanto, tal temática, expondo e refletindo sobre as repercussões dos conflitos relatados pelos surdos na situação de contato com o mundo dos ouvintes.Os resultados revelam os impactos de que a língua do outro não é um escolha para os brasileiros surdos, é uma necessidade imposta claramente pela falta de acessibilidade linguística.